quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

Sonata - Parte 11 - 4 de Julho


 

O aerocarro de Maynard tem muitos segredos. A Inteligência Artificial do aerocarro é como um copiloto que o mantém informado constantemente sobre o ambiente ao redor. As vias virtuais aparecem no para-brisa junto com informações de espionagem. Elas exibem dados confidenciais sobre os condutores próximos, transporte de substâncias ilícitas, detecção de viaturas policiais e rotas alternativas para fuga. A polícia passa várias vezes por perto, mas são incapazes de detectá-los naquele enxame de aerocarros em Sonata.
- Eu não entendo... – diz o agente – Os noticiários não mencionaram seu nome, nenhuma Lei Marcial foi instaurada e não vejo nenhum Securitron rondando as passarelas.
- Isso pode ser bom. Assim poderei fugir para a superfície. – responde Nathan.
- Você sabe que agora é um Inimigo de Estado, não é? Se você falar o que sabe para as pessoas certas, poderá causar uma insurreição.
“Inimigo de Estado?” pensa Nathan. “É assim que me chamam agora”?
- Ninguém se voltaria contra as corporações. – responde ele, ingenuamente.
O mercenário ri.
- Faz ideia de quantos fanáticos extremistas existem só esperando o momento certo para se rebelar?
Eles seguem seu caminho. Maynard pega uma avenida virtual de duas faixas para um dos distritos residenciais do Setor A.
No Setor A ainda predomina o clima de expansão da cidade. As máquinas de construção e os operários humanos e robóticos estão presentes, sendo eles os responsáveis por sua construção.
O aerocarro se aproxima de um distrito chamado Mecanicistas, sobrevoando as colossais obras de expansão financiadas pela Electro Core. O aerocarro mergulha entre as torres e passarelas até Maynard parar em um estacionamento no meio de uma megatorre.
Eles desembarcam e encontram um lugar úmido e cinzento. Enormes hélices acopladas nas paredes renovam o ar e fossos de luz iluminam timidamente o ambiente. Naquela hora do dia tudo parecia silencioso e abandonado, as passarelas estavam vazias, as luzes dos corredores piscavam e os elevadores pareciam não serem usados há anos. Ao descerem por um lance de escadas, Nathan toca o corrimão e o vê enferrujado. E pensar que aquele era um dos distritos mais recentes de Sonata.
Alguém aparece entre os aerocarros e grita:
- Parados!
Os dois veem um homem apontar um fuzil laser a eles. O homem veste uma farda bege com camuflado digital. Em seus pés eles veem coturnos cor de areia e em sua cabeça há um capacete com viseira. Em seu ombro há uma bandeira de cores vermelha, azul e branca que Nathan não consegue reconhecer. Atrás deles vários outros homens armados aparecem, cercando-os.
- Abaixem as armas! Eu sou o agente Maynard Cuisset, vim trazer o pacote!
“Pacote?” pergunta-se o rapaz.
Ao abaixarem seus fuzis, o homem à frente diz:
- Está atrasado. Era para você ter chegado ontem.
- Tive contratempos. – responde ele, de improviso.
Em seguida eles os deixam passar. Nathan os observa, aquela era uma milícia paramilitar composta de soldados fanáticos com um manifesto político. Entrando em um andar da megatorre, eles o encontram adornado inteiramente de bandeiras, cartazes, frases de ordem e citações históricas escritas nas paredes. Todos os apartamentos têm suas portas abertas e servem de compartimentos naquele grotesco Quartel-General. Os soldados, “políticos” e simpatizantes andam calmamente pelos corredores. Eles andam com fuzis nas costas, pistolas nos coldres, pastas nos braços e arquivos em suas mãos.
Nathan então reconhece a bandeira, a bandeira do velho país agora levemente alterada à nova causa dos pseudo revolucionários americanos. As bandeiras estão em toda parte e algumas contém um símbolo, uma espécie de brasão. Ele vê uma águia careca de asas abertas segurando um ramo e um punhado de lanças nas patas. Em seu bico há uma faixa com uma frase escrito “E Pluribus Unum”, mas ele não sabe o que significa.
Eles entram em um apartamento abarrotado de servidores. Os técnicos usam computadores com cabos conectados aos seus crânios e óculos de realidade virtual para navegar no ciberespaço. “São hackers” pensa ele. Um homem vestido com farda militar um pouco mais requintada observa atentamente as informações aparecerem nos monitores de LCD. Ele não é diferente da maioria dos cidadãos de Sonata, pois tem próteses biomecânicas, visão aprimorada, implantes no crânio e com certeza uma dezena de implantes ilegais espalhados no corpo.
- Estou atrapalhando? – pergunta Maynard.
O homem se vira e, ao vê-los, responde:
- Está atrasado.
O agente sorri e o cumprimenta.
- Olá, George. Eu trouxe o pacote, como prometido.
O líder do 4 de Julho é um homem sério e objetivo. Ele olha para Nathan em silêncio, como se estivesse analisando-o e isso deixa o rapaz muito desconfortável. George então os leva para um apartamento com uma grande mesa de reunião no centro.
Ao fechar a porta retrátil, ele diz:
- Nathan, você é bem famoso, sabia? Esta cidade tem milhões de habitantes, muito maior do que qualquer outra antes de 2057, mas você foi um entre milhões... – comenta ele, dando ênfase às suas palavras – que viu o que existe fora da Contenção. E você ainda está vivo, diferente de muitos outros que morreram ao sair. Estou impressionado.
O rapaz olha ao redor e gagueja um pouco antes de responder.
- Não foi minha intenção destruir minha vida. Eu não quis nada disso.
- O seu arquivo no Ministério da Informação diz o contrário. Você é filho de criminosos políticos e potencial agitador também.
- Eu sou inocente, é isso o que importa.
George deixa escapar um sorriso. Andando pela sala, ele discursa:
- De acordo com o Ministério da Segurança Pública, em Sonata existem três tipos de punição: Detenção, Execução e Banimento. A Detenção tem caráter “filantrópico” e procura recuperar o indivíduo, livrando-o de sua criminalidade; a Execução é uma ferramenta reguladora, pois além de punitiva busca eliminar os criminosos violentos, diminuindo convenientemente a superpopulação da metrópole; o Banimento é a sentença final, a estrela da opressão corporativa, quase um mito entre os cidadãos que vivem sob a sombra desse terror. É o castigo dado principalmente aos presos políticos, ativistas, agitadores e terroristas, qualquer um que espalhe uma causa ideológica que resista, combata ou despreze a ditadura corporativa. Infelizmente para você, Nathan, você seria banido de Sonata, pois com seu histórico pessoal e familiar, você seria classificado como um terrorista.
Nathan sente calafrio. Naquele momento ele percebe que é mais perigoso do que uma organização terrorista inteira.
Ele responde:
- Já me chamaram de Inimigo de Estado uma vez, mas não sou eu o terrorista aqui.
- Certamente. – responde calmamente o homem – Mas você fugiu de uma penitenciária, foi visto com um mercenário e hoje está no QG de uma organização que propaga o terror. Quem acreditaria em sua inocência agora?
Então o rapaz se cala. George o tem em suas mãos.
- O que você quer comigo?
- Informação. – responde ele, como se fosse a coisa mais óbvia – O que pode ser tão importante para fazer as corporações prenderem-no simplesmente por caminhar nas ruínas?
- Não estou disposto a dar informações a um grupo terrorista.
- Oh, terrorista é uma palavra muito forte... – sorri ele – Somos ativistas, revolucionários, libertadores... Lutamos pela soberania americana na metrópole e a deposição do regime autoritário e fascista das corporações. Somos constitucionalistas, lutamos pela liberdade e independência, assim como nossos antepassados o fizeram nos anos de 1775 a 1783.
Sem querer admitir, Nathan demonstra interesse.
- Essa organização tem origens históricas?
- Mas é claro. E suas origens são mais antigas do que você pensa.
“A Revolução Americana foi a rebelião das treze colônias da Grã-Bretanha, que declararam-se independentes em 1776, passando a se chamar de Estados Unidos da América. A guerra teve origem na resistência de muitos americanos contra os altos impostos sancionados pelo Parlamento britânico, dos quais os americanos afirmavam ser inconstitucional. Protestos patrióticos surgiram, desde boicotes a ataques a barcos ingleses em Boston. Os ingleses contra-atacaram e os patriotas responderam criando um governo ilegítimo na província de Massachusetts. As outras doze colônias apoiaram o levante e juntas criaram um Congresso Continental, coordenando a resistência, organizando comitês e convenções que efetivamente tomaram o poder dos ingleses. Após uma série de batalhas e eventos, grandes nomes surgiram na História dos Estados Unidos, como o general George Washington, responsável pela vitória em Boston em março de 1776. E foi nesse ano que foi assinada a famosa Declaração de Independência no dia 4 de Julho, tornando-se a maior comemoração patriótica dos Estados Unidos”.
George fala com tremenda convicção e domínio, como se fosse um apaixonado professor.
Nathan pergunta:
- Mas o que aconteceu depois? O que houve com os Estados Unidos e seu governo?
- Não sabemos. – lamenta-se ele – Muito pouco foi descoberto sobre o período antes da catástrofe que devastou o planeta. Pandemias globais, incidentes diplomáticos, guerra nuclear... Muitas são as teorias, é difícil dizer. O que se sabe é que os Estados Unidos entraram em colapso e simplesmente deixaram de existir.
Como toda conversa que Nathan vem ouvindo nos últimos dias, ele acha isso muito difícil de acreditar.
- A nação americana entrou em colapso devido a uma crise global?
- Não apenas os Estados Unidos, mas muitos países também. O quadro territorial político foi alterado e nunca mais se recuperou. Infelizmente não sabemos explicar por que isso aconteceu, mas o mundo se fragmentava muito antes da Catástrofe de 2057. Há muitos mistérios envolvidos e só as corporações conhecem esse segredo.
Mais uma vez Nathan se convence de que há uma conspiração em Sonata.
- Por que vocês querem o retorno de uma nação decaída e condenada ao passado?
George e os outros ativistas se ofendem gravemente.
- Nossa organização é um movimento separatista destinada a restaurar o poder. – responde ele, quase rosnando – Nosso povo foi responsável pela consolidação do Ocidente, nossa nação venceu os regimes totalitários europeus e liderou a OTAN. A liberdade e a paz por muito tempo foram mantidas à custa do nosso sangue! E iremos devolver a soberania da metrópole a nós, os verdadeiros americanos!
O rapaz fica em silêncio por um tempo até perguntar:
- Sua organização não se importa que em sua onda de violência separatista muitos inocentes podem morrer?
- Não será nada comparado aos milhões de americanos que morreram em combate enquanto levavam paz às terras estrangeiras. O que fazemos aqui é recuperar o que é nosso por direito. Tiraremos o poder das corporações e o entregaremos aos únicos merecedores de governar a metrópole, a 4 de Julho.
O que o rapaz ouve são as palavras de um futuro ditador.
- E quanto aos não-americanos? – pergunta ele – Quero dizer nós, de descendência canadense, teremos lugar em seu governo pró-América?
George faz um sorriso irônico. Ao invés de responder à sua pergunta, ele muda de assunto.
- Preste atenção, o que você ouviu aqui não ensinam nas escolas sonatenses. Essa metrópole será nossa, nossos pais fundadores nos confiaram essa tarefa. Que minhas palavras te sirvam de inspiração e lhe mostrem o caminho quando a luz da verdade resplandecer em sua vida.
Então o homem se vira e começa a conversar com Maynard.
Nathan conhece a verdade obscura. Ele sabe do plano sinistro que transformou as ruínas do velho país em um pátio industrial e seus indefesos habitantes em cobaias de laboratório. O dilema surge em sua mente. Deveria ele confiar nos terroristas revelando-lhes a verdade, ou manteria ele o regime corporativo intacto, consolidando-os no poder?
George se senta à mesa e então diz:
- Nathan, diga-me detalhadamente o que aconteceu no Setor L.
- Eu direi com uma condição. Por que esta informação é tão importante? O que vão fazer com ela?
O homem respira fundo, o rapaz é muito questionador.
- Usaremos a informação para abalarmos o controle que as corporações detêm. Revelaremos a verdade, traremos à luz seus segredos. Vamos difundir a notícia de que não estamos sozinhos no mundo. As massas irão se revoltar, elas questionarão o governo autoritário que as manipulam. Haverá protestos, manifestações, greves, rebeliões... A desestabilização irá enfraquecê-los.
- Isso me parece mais prejudicial do que bom. Que proveito você tiraria disso?
- Com os meios de produção parados, as bases do sistema corporativo irão cair. Sua informação será o pontapé inicial da Revolução, ela causará a greve geral, necessária para iniciarmos a luta armada e tomarmos o poder.
Nathan se assusta. Sua informação é mais valiosa do que pensa.
- E se hipoteticamente vocês tomarem o poder, o que será depois?
- Instauraremos uma República Federativa Constitucional Presidencialista, pacífica e democrática, alinhada aos ideais iluministas de sua origem: Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Criaremos uma nova Constituição, os ministérios trabalharão em defesa do povo, e não contra ele. Será o triunfo máximo dos revolucionários e um novo começo... para os americanos.
O líder da 4 de Julho tem domínio total do assunto e fala com muita clareza, de modo admirável. Mas novamente ele discrimina o resto dos habitantes de Sonata em prol de seu próprio povo. Nathan percebe que ele não está sendo honesto.
O rapaz não se convence. Não é possível confiar seu conhecimento a um bando de fanáticos e terroristas. Porém, ele tem uma dívida de gratidão com a 4 de Julho, afinal eles os salvaram da prisão.
- Me esqueci de mais uma coisa. – diz Nathan e imediatamente os facciosos lhe fazem um olhar de irritação e tédio – Eu estou doente. Nas ruínas eu fui infectado por um vírus...
- Vírus? – pergunta o líder e então Maynard diz:
- Ele alega ter sido infectado por um vírus e agora tem poucas horas de vida.
- É contagioso?
O mercenário olha para Nathan, esperando ele responder.
- Eu não sei. Preciso encontrar um homem chamado Database. Ele vive na superfície e é o único que pode me curar.
Os ativistas se entreolham.
- Database...?
- Sim. Quero que me prometam me levar até ele, e então eu direi tudo o que sei.   
Falando de maneira austera, o líder responde:
- Você tem a nossa palavra de que o ajudaremos a encontrar a cura.
Eles então ficam em silêncio. Nathan não confia em George, mas não há mais tempo para decidir. Os olhos estão fixos em Nathan e ele pondera rapidamente na forma de como vai mentir. Ele responde:
- Está bem, eu digo o que sei.
Contra sua vontade, Nathan organiza seus pensamentos e se prepara para descrever como tudo começou. George, seus assessores e até o agente Maynard se silenciam para ouvir o que ele tem a dizer. Então algo acontece.
O alarme soa de repente. Ao ouvirem o alvoroço se formar nos corredores, um dos ativistas aparece e informa:
- General Washington, a polícia invadiu nosso perímetro! Precisamos da camuflagem agora!
Então Nathan se assombra. O líder da 4 de Julho, o mesmo que expressa seus ideais com convicção e fanatismo, denomina a si mesmo como “General George Washington”?
- O quê?! Como eles nos acharam? Nunca deixamos rastros! – o líder chama o agente e diz
- Maynard, me acompanhe, posso precisar de ajuda.
Os dois saem da sala e deixam Nathan sozinho. Com a porta fechada, ele ouve os alarmes e a correria no corredor. O rapaz espia pela janela, tentando ver o que está acontecendo lá fora, mas só vê a escuridão e o vapor exalando dos dutos. Ele está em um verdadeiro covil terrorista.
George retorna à sala com Maynard e mais dois hackers.
- Isto é sabotagem! Abaixaram nossas defesas e nos deixaram expostos!
- Mas quem faria isso? – pergunta Maynard.
- Eu não sei. Talvez os Puristas, os Trans-humanistas ou os Clérigos do Recomeço. Temos muitos inimigos, todos disputamos o poder. – responde o general.
- Devemos encerrar essa guerra ideológica agora se quisermos atacar abertamente as corporações. – comenta um hacker.
- Eles nos atacam jogando o inimigo mútuo contra nós. Obviamente hackearam nossos dispositivos, mas como conseguiram passar pelos firewalls? Nossos hackers os programaram para serem intransponíveis! Quem teria tamanha tecnologia?
Enquanto os ativistas discutem, explosões são ouvidas ao longo do andar e a luz avermelhada da Polícia invade a sala.
- Eles estão aqui! Defendam a base! Evacuem o equipamento! Agora!
- Espere um pouco... – interrompe um ativista – Eles não são a Polícia! Esse vermelho... É a Bushido!
O rapaz se assusta. Esse nome refere-se a outra facção terrorista, porém composta de asiáticos, sobretudo japoneses. Semelhante a 4 de Julho, essa facção também acredita no ressurgimento de seus antigos governos. Mas a Bushido rivaliza diretamente com a 4 de Julho, pois quer a metrópole sob o domínio do imperialismo japonês.
Tiros são ouvidos, aparentemente os invasores possuem armas lasers. De repente há uma explosão e a janela voa em milhares de pedaços, lançando Nathan e os outros contra a parede. A luz se apaga e Nathan consegue ver as miras lasers riscando a escuridão e a fumaça. Então soldados com armaduras enormes e óculos de visão noturna aparecem, descendo a lateral do prédio pendurados em cordas.
Os ativistas se assustam. Antes dos invasores apertarem o gatilho, George tomba a mesa e a usa como cobertura.
- Corram! – grita ele.
Os soldados da 4 de Julho aparecem e trocam tiros com os invasores. Alguém lança uma granada e a explosão os atira para longe, fazendo-os cair no enorme fosso entre as megatorres.
Apavorado, Nathan se arrasta para fora do apartamento. Ao sair ele vê a confusão no corredor, as luzes dos alarmes giram freneticamente e a sirene alta irrita seus ouvidos. Os ativistas correm de um lado ao outro com armas nas mãos. Nathan apoia-se na parede e, ao tossir, sua boca espirra sangue.
Caminhando lentamente pelo andar, ele se aproxima de outro apartamento quando a porta se explode de repente. Continuando a caminhada, outro apartamento se abre e ele vê pessoas em chamas correndo por socorro. Mais adiante, um ativista é lançado para fora de um apartamento, colidindo contra a parede do corredor.
Nathan consegue ver os soldados de elite da 4 de Julho. Eles vestem as fardas camufladas para deserto, usam botas cor de areia e coletes a prova de balas. Também usam bolsas d’água nos braços, óculos de proteção, bolsas de perna, fuzis lasers, granadas penduradas em seus peitos, capacetes robustos e muito mais. Aqueles homens realmente estavam preparados para a guerra.
- Abaixem-se! – grita alguém atrás dele.
Virando-se para ver o que está havendo, ele vê um foguete brilhante aproximar-se de suas costas. Lançando-se rapidamente ao chão, o foguete continua seu trajeto e explode em algum lugar adiante. Nathan não teve seu corpo despedaçado por um triz. As chamas se alastram, os sprinklers espirram água e logo o ambiente torna-se um misto de fogo, água, fumaça e suor.
O rapaz se senta no chão. Os tiros atravessam as paredes e o revestimento suja sua cabeça. Não havia tempo para descansar, ele tinha de fugir dali imediatamente.
Passando por um apartamento, ele vê ativistas atirando em um grupo de soldados vestidos de vermelho. Nathan sente medo, os invasores usam máscaras de demônios!
Outro apartamento está totalmente destruído e há vários mortos no chão. A mobília retrátil move-se de um lado ao outro, soltando faíscas durante o mal funcionamento. Um buraco na parede revela uma escadaria no cômodo ao lado. E então algo acontece.
A janela do apartamento se explode de repente, lançando Nathan para trás. Vozes são ouvidas entre a fumaça, mas a audição é muito difícil devido a explosão. Alguém se aproxima pelos estilhaços espalhados pelo piso, com passos determinados até se depararem com ele. E então Nathan consegue ver.
Uma mulher está em pé à sua frente. Ela veste roupas apertadas e pretas, suas botas vão até os joelhos e em seu peito há um rolo de corda. Mas algo lhe chama a atenção, ela veste uma inconfundível máscara ninja, ocultando seu rosto.
“Uma runner...?” pensa ele.
Aparentando ter dificuldade ao enxergar, ela retira a máscara e chacoalha os cabelos. Nathan se encanta, eles são dourados como os raios de sol. A mulher o encara, seu olhar é frio e insensível, mas Nathan não se importa. A expressão do rapaz é de puro assombro. Sem dizer uma única palavra, ele apenas pensa. Nathan está diante da mulher mais linda que ele já viu.
Alguém grita da janela:
- Laura! Ele está aí? Você já o pegou?
O rapaz sente seu coração disparar. Ele não sente medo, apenas o agradável sentimento de amor crescer em seu peito descontroladamente. A mulher hesita ao responder. Olhando o rapaz ferido e assustado aos seus pés, ela não entende como pode haver carinho em seus olhos. Então Nathan percebe. Ela sentiu o mesmo por ele também.
Por fim a mulher responde:
- Não... não há ninguém. Ele não está aqui.
Virando-se, ela caminha de volta à janela e vai embora. Mas antes que pudesse sair, Nathan reúne suas forças e a chama:
- Laura...!
A mulher o ouve e olha para trás. Uma nova onda de fumaça se ergue e, quando a visão fica nítida novamente, ela havia desaparecido.
Novamente se esforçando, o rapaz tenta se aproximar da janela quando alguém diz:
- O que você está fazendo? Temos que fugir daqui!
Um ativista da 4 de Julho o agarra pela roupa e o leva para o buraco na parede. Nathan o atravessa, mas antes que seu companheiro pudesse acompanha-lo ele é alvejado por vários tiros lasers nas costas.
Ainda confuso, ele sobe as escadas, deixando aquele banho de sangue para trás. Muitas pessoas correm ali também, mas são simples residentes da megatorre. Nathan se entristece. O fanatismo dos terroristas não se importa com os inocentes mortos no fogo cruzado.
Entrando em outro andar, ele vê a porta do elevador se abrindo. Dezenas de pessoas desesperadas veem o elevador e correm em sua direção. Rapidamente o rapaz aperta os botões e as portas se fecham, livrando-o daquela multidão.
O elevador sobe até chegar ao terraço. Ao abrir as portas, ele sente o vento frio da noite e se abraça. Correndo ao ar livre, ele passa por alguns aerocarros estacionados e dutos de ventilação. Não havia polícia, moradores ou transeuntes ali, não havia ninguém. Ele ergue a cabeça e vê o horizonte brilhante da metrópole. “O que é que está havendo?” pensa ele.
Ao passar por uma parede, a cauda de um rifle acerta seu rosto e ele cai no chão. A visão é confusa, mas ele consegue ver. Soldados permanecem ao seu redor e o encaram. Eles vestem horrendas armaduras vermelhas e capacetes com máscaras. As máscaras fazem carrancas horríveis como se fossem seres demoníacos. Ele vê ombreiras, caneleiras e proteção para as coxas, a armadura envolve seus peitos e há faixas amarradas às suas cinturas. Os capacetes são longos e alguns têm lâminas e chifres. O rapaz vê fuzis lasers em seus braços, mas não é isto que o assusta. Aqueles homens portam longas e afiadas espadas, com lâminas curvas e cabos enfaixados.
“Katanas” pensa ele.
- Kyaputen, nós o pegamos.
Outro homem aparece ao seu lado e se curva para enxergá-lo melhor. Subindo sua horripilante máscara, Nathan consegue ver os longos fios de barba em seu bigode e seu queixo, todos grisalhos. O homem sorri, fazendo seus olhos puxados se fecharem ainda mais.
- Ora, ora... Como vai, Nathan-san? Você nos deu muito trabalho, sabia?
O sotaque do homem torna difícil entendê-lo.
- Quem são vocês...?
- Não se preocupe, somos amigos. "Tomodachi"... – então ele se levanta e ordena – Podem levá-lo!
Então um soldado aparece e bate em seu rosto, desmaiando-o imediatamente.



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