sábado, 23 de fevereiro de 2019

Sonata - Parte 29 - Uma Visita Inesperada



Sentado em uma banqueta, Maynard come seu macarrão com legumes em uma barraca de comida chinesa sobre a plataforma. Chovia em Sonata, e no distrito de Obedience – Setor D, as pessoas voltavam apressadas para casa.   
Usando seus hashis, ele come assistindo ao noticiário na televisão. O apresentador informa sobre o aumento alarmante de atentados terroristas na metrópole no último ano. As facções entraram em um frenesi de violência desde o começo da rebelião e as autoridades culpavam exclusivamente o Inimigo de Estado. Em uma coletiva de imprensa, o Ministro de Segurança Pública diz:
“Encontraremos o Inimigo de Estado, esse Nathan Hill que nos causou tanto transtorno e sofrimento, e ele pagará por seus crimes contra a população sonatense”.
Alguém pergunta se há previsão para o fim das hostilidades. O ministro responde.
“Quando desmantelarmos essa organização paramilitar de rebelados, as hostilidades cessarão. Capturaremos o Inimigo de Estado, vivo ou morto se necessário”.
Maynard continua assistindo tranquilamente. A chuva cai no telhado da barraca e algumas gotas molham seu casaco. Virando-se, ele tenta se proteger quando percebe algo. Enquanto os pedestres passavam pela plataforma, ele vê algumas pessoas em outras barracas, sentadas distantes umas das outras, olhando para ele.
Levantando-se, ele paga o atendente e discretamente deixa o local.
Entrando no túnel, ele caminha com as mãos nos bolsos e de cabeça baixa, tentando se misturar. Olhando para trás, ele não vê ninguém, mas ainda se sente observado. Entrando na megatorre, ele caminha pelo corredor e se dirige ao elevador. Emitindo um som de sino, as portas se abrem e Maynard entra, apertando o botão de seu andar em seguida.
Antes das portas se fecharem, ele vê de relance duas pessoas estranhas entrarem no corredor logo atrás. Disfarçando, ele limpa sua garganta e olha para baixo.   
Dez minutos se passam. Maynard está calmamente encostado na parede do corredor. Ao ouvir o som da explosão, ele confirma sua suspeita. Alguém tentou invadir seu apartamento, explodindo-o com o objetivo de mata-lo.
Bocejando, Maynard olha para o seu relógio. Apertando os botões no painel da porta, ele entra em outro apartamento e deixa a porta aberta atrás de si. Passos são ouvidos no corredor. Duas pessoas correm apressadamente, aproximando-se de sua posição.
- Ei! – grita ele ao ver os dois – Estão procurando por mim?
Ao ligar a luz, os dois se espantam ao ver o mercenário sentado em uma poltrona de frente para eles. Sem dizer uma única palavra, um homem vestido de azul retira sua arma do coldre e aponta para o seu rosto. Maynard se joga para trás ao ouvir o disparo. Segundos antes, o mercenário havia ativado seu Campo de Força, fazendo o projétil se achatar contra uma parede verde e quase invisível. A parede protetora tremula calmamente, como se fosse o efeito de uma pequena pedra lançada na água.
Ao ver a bala cair no chão, o mercenário diz:
- Ah! Arma de fogo? Não sabia que mais alguém usava essas armas arcaicas e ultrapassadas...
Uma runner, companheira do homem de azul, aperta os botões na parede e logo aparecem mesas e sofás retráteis. Os dois se escondem atrás deles e continuam atirando. O mercenário retira de seu bolso um objeto cilíndrico, era o dispositivo de seu campo de força, e se repreende ao ver que se esqueceu de recarrega-lo.
Tirando uma bomba de gás de sua jaqueta, Maynard a atira contra os invasores. Ao estourar e exalar o gás, ele empunha sua pistola laser e se levanta. Antes de poder mirar, ele é surpreendido pela mulher apontando sua arma para seu peito. Atirando, o impacto o lança violentamente contra a parede.
O corpo do mercenário brilha em uma cor amarelada. Os invasores se intrigam ao vê-lo se levantar novamente e sem nenhum ferimento visível. Ele mexe em seu cinto e os invasores conseguem ver. O mercenário estava usando um cinto Escudo, um dispositivo altamente tecnológico, mais eficiente que os robustos coletes a prova de balas.
Maynard atira na mulher e ela cai atrás do sofá. O homem ainda está sufocando com o gás, então o mercenário corre em sua direção e lhe dá uma voadora, fazendo-o voar contra a parede do corredor. Os dois entram em luta corporal e Maynard, sendo mais experiente e mais bem treinado, o puxa de volta para o apartamento e o empurra contra a janela, fazendo-o cair junto com os estilhaços lá embaixo.
- Androide! – grita a mulher.
- Androide?! – intriga-se Maynard – Por acaso seu amigo é um robô?
Enfurecida, ela se levanta e entra em luta corporal com ele. Suas habilidades e agilidade são formidáveis, surpreendendo Maynard, que apesar de seu treinamento militar, sente dificuldade em manter a briga.
O invasor cai alguns andares, colidindo com alguns tubos de refrigeração. Ele consegue se agarrar a uma grade e interrompe a enorme queda, salvando-se da morte. Ferido e desarmado, ele olha para cima e começa a escalar de volta, ele tinha que ajudar a runner.
Além da dor em seu corpo, seus olhos, seu nariz e sua garganta ardiam devido ao gás. Além disso, ele vê que sofreu alguns danos em suas próteses biomecânicas.
Escalando a lateral da megatorre, ele passa por algumas janelas e consegue ver os apartamentos por dentro. O isolamento termoacústico das janelas inibe os ruídos e as pessoas nem mesmo percebiam sua presença. Em um apartamento, ele vê uma mulher fazendo atividade física com seu personal trainer holográfico. Acima, um homem vestido com uniforme de operário injeta drogas estimulantes em seu braço antes de ir trabalhar. Em outro apartamento, o invasor vê um garoto se masturbando enquanto assiste a um filme pornográfico no computador. O homem sentia um mórbido interesse ao espionar a privacidade alheia.
O tal Androide chega ao seu objetivo e, ao se agarrar na beirada, vê sua companheira sozinha e imóvel no meio da sala. Ele se joga para dentro e grita:
- Alexia!
- Não! Não se aproxime!
O homem corre em sua direção. Algo se espeta em sua jaqueta e o eletrocuta, fazendo-o gritar e cair no chão. Percebendo que o local estava seguro, Maynard se levanta, calmamente recarrega suas armas e por último abana suas roupas.
O mercenário se aproxima do invasor e o algema. Chutando-o levemente, ele diz:
- Ei, rapaz. Acorde.
A runner o encara ferozmente. Então ele pergunta:
- Quem são vocês? Quem os enviou aqui?
A mulher cospe em seu rosto. Maynard ri e balança negativamente a cabeça.
- Pela cara de vocês vejo que não são da polícia, são assassinos de aluguel. Vieram aqui para eliminar o alvo e encerrar o problema, sem satisfações ou perguntas desnecessárias... – Maynard sorri, ele gostava disso. – Quem os enviou? Cellgenesis? Cybersys? As facções? Ou foram os fascistas da polícia corporativa?
- Não somos da polícia. – responde o invasor.
- Então quem são?
Eles não respondem. Tirando sua arma da jaqueta, Maynard a aponta para a cabeça da mulher.
- Não! Eu falo o que quiser, mas não a machuque!
- Estou esperando. – responde ele com a arma ainda apontada para ela.
- Somos do Submundo.
O mercenário se surpreende. O Submundo é a sede dos rebelados e do Inimigo de Estado. Seus agentes são os runners, os famosos mercenários da superfície. Hackers, couriers, ladrões e até assassinos, não importava a classe. Eles agiam em causa própria, sem ligações políticas ou religiosas a nenhuma facção. São habilidosos e ágeis, o melhor subproduto que Sonata tinha a oferecer.
- Por que o Submundo me quer morto?
O homem ia responder, mas a mulher intervém.
- Me diga você.
Maynard pondera. Eles ouvem sons de sirene no lado de fora, as viaturas policiais estavam por perto. O mercenário ia dizer algo, mas uma bomba de luz se estoura, cegando seus olhos. Caindo de joelhos, ele põe as mãos no rosto e grita.
Alguns minutos se passam. A visão do mercenário retorna lentamente e então ele consegue ver. Os invasores haviam desaparecido.
As viaturas se aproximam, iluminando o ambiente com suas cores vermelhas e azuis. Os residentes dos outros apartamentos também aparecerem, fazendo olhares assustados e curiosos. Sem tempo para procurar pelos invasores, o mercenário se levante e diz para si mesmo.
- Tenho que sair daqui.


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