quinta-feira, 13 de janeiro de 2022

Quem Corta o Cabelo dos Cabelereiros?

 


Quem corta o cabelo dos cabelereiros?

Um espertinho pode responder

“Um outro cabelereiro!”

Mas é como perguntar

Se pode o mesmo médico

Sozinho se operar

 

Outro cabelereiro

Tem outro jeito de cortar

Outra mão e outra técnica

E outras tesouras para usar

 

Outro me vestirá com uma capa

Ensebada porque nunca foi lavada

Colocará um papelzinho ao redor do meu pescoço

Seguro o riso porque faz coceguinhas um pouco

 

Os meus cabelos outro pode lavar

Com torneira ou água ele borrifar

Ou não lavar com coisa alguma

E começar com minha cabeça suja

 

Com seu tic, tic, tic enquanto corta

Medindo a simetria enquanto me olha

Ele me pergunta

“Qual o comprimento?”

Eu respondo

“Em cima pode tirar um dedo”


O cabelereiro inicia uma conversa sem interesse

Apenas para conhecer seu novo cliente

Mas a conversa é inútil e irrelevante

Acho que sou muito inteligente 

E ele muito ignorante 


Raspando com a maquininha

Eu peço

“Não deixa nenhuma marquinha”

Fazendo na nuca o “pezinho”

“Na barba pode deixar quadradinho”

 

Ele passa gel sobre as orelhas

E corta com notável destreza

Passando a navalha atrás no meu pescoço

Ao raspar minha pele ela arde um pouco

 

Me pergunta para qual lado eu penteio

Eu respondo

“É para frente que eu deixo”

Um arremate antes de encerrar

A franjinha e as pontas ele começa a aparar

 

Me pergunta

“Você quer passar gel, chefia?”

Eu respondo

“Não por que tomarei banho em seguida”

Pois nas roupas os cabelos cortados

Me pinicam, deixando-me incomodado

 

“Ficou cinquenta reais”

“Cinquenta reais?!” eu exclamo

“Por que não cobra logo cem?”

“Pois eu sou cabelereiro também”

“E nunca precisei extorquir ninguém”

O cabelereiro se encosta no banco

E ri igual a um tonto

“São apenas vinte mangos”

“Aquilo não era sério”

“Eu só estava brincando”

 

Eu me sento no banco da rodoviária

Haviam muitas pessoas com suas malas

Nos guichês elas compram as passagens

Passageiros chegam e saem de viagem

 

Sopra o vento em meu cabelo curtinho

Será que eles veem como eu estou bonitinho?

Por estar curto eu sinto um tremendo frio

Mas apesar do frio eu sorrio

 

“Os cabelereiros são essenciais”

“Seu ofício os tornam especiais”

“Uma arte um tanto incompreendida”

“Apenas um coração sensível os valorizam”

 

Entardecia lá dentro

Eu respiro fundo em lamento

Essa pergunta consome o meu tempo

Eu poderia pensar nela o dia inteiro

Apenas me perguntando em silêncio

Quem corta o cabelo

Dos cabelereiros

 

 

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