Nasci em um país perfeito
Onde os impostos altos e a desigualdade
Destroem os meus sonhos e minhas vontades
Nasci em uma família perfeita
Onde tenho por parâmetro não ser
Tudo aquilo o que eles insistem em ser
Novamente o ônibus lotado
Trânsito pesado, poluição e ar condicionado
O estresse de uma rotina de amargura e penúria
Só mais um dia em minha vida de tristeza e angústia
Não converso mais com ninguém
Ouvir seus problemas não me faz bem
Os mesmos problemas que nunca vão embora
Por que a solução tanto demora?
Parece que seus sonhos não se realizaram
E que ninguém conseguiu superar seus passados
Que sua vontade natural de independência
Os condenaram à uma família interesseira
Parece que eles não se esqueceram de seus antigos amigos
Que lhes rejeitaram, abandonaram e lhes trataram como inimigos
Que sua vontade de se vingar, sendo entre eles o melhor
Os afundaram no fracasso, sendo de todos eles o pior
Parece que seus sonhos de fazer uma faculdade
Não se realizará devido a tantas dificuldades
Problemas financeiros que assolam tantas famílias
Sufocam seus talentos, impedindo-os de mudar suas vidas
Os solteiros sofrem por não ter alguém
E não conseguem achar quem eles queiram também
Os casados sofrem de isolamento físico, afetivo e emocional
E em suas faces eu vejo que seus casamentos vão muito mal
Poluição atmosférica
Calor, frio e confusão pluviométrica
Poluição audiovisual
Pelos cantos sujeira e matéria fecal
Meus sapatos velhos pisam no asfalto
Eu atravesso a avenida entre os carros e o som alto
Nesse mundo há escassez de oportunidades e de provisões
Onde abandonamos nossa humanidade, disputando-as como cães
O mundo nos odeia
E seu ódio implacável nos rodeia
Ele quer nos tragar em nossa agonia
E segue nos torturando dia após dia
A depressão de nunca poder se abrir
A certeza de ninguém querer te ouvir
O passado que você não consegue superar
O futuro que você não consegue mais sonhar
Cresce a fila nos hospitais
Quem entra lá, vivo não sai mais
Cresce o índice de desemprego
E eu precisando tanto de dinheiro
O desespero preenche o vazio
Eu não aguento mais esse sofrimento comigo
E sem mais ter forças para o suportar
Vem crescendo a vontade de me matar
Não sei que horas são
Tiro o celular do meu bolso, segurando-o em minha mão
Esse foi o tempo suficiente
Para que ladrões em uma moto aparecessem
Ladrões roubam o meu celular
O mesmo que demorei tanto para comprar
Que ainda faltava o pagamento de dez prestações
Estourando o limite dos meus dois cartões
Gente feia, agressiva em sua abordagem
Pela aparência pareciam até selvagens
Com revólveres velhos e até enferrujados
Nas laterais de suas cabeças, os cabelos raspados
Eles puxam o aparelho junto com o fone de ouvido
Aquele que eu gostava tanto de tê-los comigo
No celular tinha as músicas que eu gostava de escutar
Que me distraíam da realidade dura que eu era obrigado a suportar
Assim como vieram, eles vão embora de repente
E assustado, me pressiono de costas contra a parede
Sem fôlego eu me sento ao lado dos montes de lixo
E do fedor nojento de urina de mendigo
As lágrimas ácidas saem em ebulição
E pareciam queimar a palma de minhas mãos
As pressiono fortemente contra meus olhos e meu rosto
Lamentando essa vida miserável de puro desgosto
Horas se passam
As pessoas me viam, mas me ignoravam
Eu devo ter adormecido na rua, como um bicho
Ao lado daquilo que eu era, um monte de lixo
Nem me lembro mais do que havia comigo
Olhando ao meu lado, eu vejo a pasta com os currículos
Eles eu sei que hoje não vou mais entregar
Não existe situação ruim que não possa piorar
Não posso me lamentar com ninguém
Amigos, conhecidos ou familiares também
Minha própria mãe não queria que eu existisse
Então eu sigo vivendo assim
Secretamente triste
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