domingo, 12 de maio de 2024

Quem Atender ao meu Funeral


(Artista desconhecido)


Quem atender ao meu funeral

Irá contemplar a brevidade da minha existência

Enquanto a terra me engole

E suas pás me encerram no túmulo

 

Cada um que carregar o meu caixão

As alças geladas em suas mãos

Contemplará com grande pena

A brevidade da própria existência

 

Falhamos em construir um paraíso na terra

A religião perfeita

Com sua moralidade inexorável

Mas aos homens igualmente impraticável

 

Falhamos em implantar o paraíso na terra

A ideologia infalível

Com sua divisão de riquezas e classes

Mas que trouxe tirania, fome e extermínio

 

Todos nós nos rejeitamos mutuamente

Ninguém quer ninguém

Todos querem ser mais do que alguém

E no festival de soberba e rejeição

Todos acabamos na solidão

 

Eu amava tanto o riso

Nos meus últimos dias

Eu vivia sempre sorrindo

O calor da alegria em meu rosto

O brilho no olhar dos outros

Gostaria de viver isso de novo

Mas meu desejo fora lançado em um fosso

 

Eu amava tanto as minhas amigas

Não éramos jovens

Mas quando ríamos, nos divertíamos

E juntos convivíamos

Nos tornávamos jovens

Como um feitiço ou um encantamento

Fruto dos bons sentimentos

Que eram a alegria, a amizade

E o amor

 

Que saudade eu tenho delas

Como eu queria voltar e abraça-las mais uma vez

Rir com elas mais uma vez

Mas eu fui arrogante

E decidi lhes dar as costas

E ultimamente ir embora

Porque assim são os adultos

Vivem, amadurecem e saem pelo mundo

E se esquecem de quem os amou muito

Pois todos temos nossos problemas para resolver

Planos para realizar

E também sobreviver

 

A esperança é a última que morre

Mas eles omitem em dizer que

Eventualmente

Ela morre

E em meu último - e único - passeio de caixão

A tampa cobre meu corpo com a escuridão

Ali eu vejo a tal esperança na minha extinção  

 

Quem atender ao meu funeral

Verá meu cadáver aninhado no caixão

Como um filho no útero

Quando vem ao mundo

Embora nem todos sejam queridos por suas mães

A cova, por sua vez, não rejeita ninguém

Recebe a todos com carinho

Como uma mãe ao contrário

Que ao invés de dar a vida

Prontamente a tira

E isso muito me anima

Receba-me, ó mãe

Em seu funesto útero

Meu tão desejado túmulo

 

Prazer inestimável é ouvir

Os golpes de pá na terra

Os sons da mesma caindo na tampa de madeira

Isso anula toda a minha tristeza

Não tenho mais nada para provar

Sonhos para realizar

Frustrações para lidar

Está tudo acabado

Um sorriso sem vida se forma

Em meu rosto gelado

 

Logo os olhos do meu espírito se fecharão

E se abrirão novamente no inferno

Meu destino parece certo

Eu o aceito com resignação

Pois talvez lá embaixo eu encontre a reconfortante

E também aconchegante 

Redenção

 

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