Morávamos em um vilarejo
Próximo a Višegrad
Vivíamos da produção de azeite
Comíamos pouco, mas o suficiente
Minha família tinha muita união
Mas de nenhum deles eu tive acepção
Pois sofria constante difamação
Pelo bosta do meu irmão
Apenas banalidades e idiotices
Que saía desse imundo
Não sei como minha família preferiu
mais
A esse vagabundo
Se era ciúme ou inveja
Eu não sabia o que era
Mas toda vez que a gente brigava
Sempre eu batia e ele apanhava
Chora mesmo, covardão
Na rua ele só sofria humilhação
De uma menina ele tomou um tapa na
cara
E outra vez um moleque
O derrubou e sentou na sua cara
Eu não queria mais continuar brigando
Eu achei que ele estava mudando
Mas se tem algo que eu me arrependo
É de não tê-lo batido por mais tempo
Em 1980 Tito faleceu
Toda a Iugoslávia se entristeceu
Em 1989 Milošević ganhou a eleição
E logo quis dominar toda a região
A Bósnia e Herzegovina não será um
estado vassalo
Nós não nascemos para ser subjugados
Não perderemos nossa terra
Não faremos parte da Pan Sérvia
Pois nossa cultura e nossa gente
Seguem caminhos diferentes
Com nossa ardente fé islâmica
Com nossas armas e nossas lâminas
Nós iremos lutar
Pois somos escravos de Alá
Allahovi robovi!
Eu fui um tolo
Eu quis lutar e defender minha nação
Meu irmão foi um covarde
Quis se refugiar como um bebê chorão
Me juntei à Brigada de Artilharia
Bosanska
Bekrija
Se os sérvios querem botar fogo nos
Bálcãs
Temos o isqueiro para queimar essas
hordas
Karadžić era contra a emancipação
Dizia que era direito dos sérvios
De governarem toda a nação
Izetbegović bravamente se opôs
Com muita coragem apesar das ameaças
E naquele momento a Bósnia sabia
Que a guerra estava declarada
Mladić era um monstro
Que os sérvios chamavam de herói
Suas tropas trucidavam nosso povo
E com escárnio diziam
“Removam os kebabs”
Brigadas sérvias
De limpeza étnica
Massacram os homens
E estupram as mulheres
Meninas ou velhas
Não interessa
Algumas são estupradas no momento da invasão
E outras são levadas
Para campos de concentração
Fico sabendo que meu vilarejo
Foi atacado pelas brigadas
Com muito medo e desespero
Eu volto para minha casa
Havia corpos por toda parte
Os sérvios haviam cometido um massacre
Assassinaram crianças e velhos
Alguns tiveram seus crânios esmagados
Por golpes de martelo
Minha casa estava queimada
E arruinada por tiros de canhões
A casa que foi de minha família
Por muitas e muitas gerações
Nada foi poupado
Apenas cinzas fumacentas
E entulho chamuscado
No quintal havia uma vala comum
Eles os fizeram cavar
Depois os fuzilaram
Em seguida os queimaram
Enterrando-os então
Eu desenterro com minhas próprias mãos
Lágrimas se escorrem de indignação
Encontro as ossadas dos cadáveres
Então eu tenho uma grande constatação
Eu encontro o crânio de meu irmão
Todo sujo e coberto de lama
Queimado até os ossos
Enegrecido pelas chamas
Aquilo me deixa espantado
Ele não tinha se refugiado?
Não fugia de tudo como uma galinha?
Por que não temeu os sérvios genocidas?
Após anos de apelidos, difamações e deboches
Sou eu que descubro a sua morte
O vejo sujo e coberto de terra
Como se na fossa eu encontrasse merda
Que ironia
Que tremenda ironia
Eu não consigo ficar triste
Com maldade ele sempre me insultou
De todas as atrocidades cometidas pelos
sérvios
Essa foi a única que me alegrou
Antes mesmo dele ter morrido
Dele eu já sentia nojo e repulsão
Então eu dou as costas e deixo para
trás
O crânio de meu irmão
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